Tenho algo em minhas mãos que de tão precioso me embarquei em um dilema que não parece ter fim: se seguro com muita firmeza e aperto mais e mais para que não escape das mãos, corro o risco de partí-lo no meio e desmanchá-lo como sonho de padaria no céu da boca. Por outro lado, se afrouxo os dedos, posso deixá-lo escapar como sonhos da minha vida no céu que nunca alcanço.
Parece triste mas o que me enxarca agora é felicidade. Acho que me aproximo cada vez mais da cadência necessária ao meu tato -
ou quem sabe a cadência nada mais é do que um resgate ou uma fuga.Um resgate da firmeza que outrora tive nas mãos. O andar pela praça com as mãos cheia de dedos que não eram só os meus. O acariciar que não machuca nem hesita, mas que se faz sentir.
Ou a fuga disso tudo. A perda da chance de hesitar ou machucar. A acidez que é a boca para o sonho da padaria. A acidez que se tornou minha boca para meus próprios sonhos.
Se peco são pelos excessos. Mas excesso mesmo é não pecar. É não se arriscar, mas também é não se preservar. É não correr, é não andar, é não voar -
ou pular de um abismo. É não ter medo de conhecer o novo, é não ter medo de perder o velho, é não deixar o novo ser velho ou insistir em renovar. É se recusar a voltar de onde veio ou partir para onde não se vai. Afinal, pra onde vou senão na direção da sombra que me acolhe?
Excesso é toda e qualquer excessão. Exceto eu, exceto nós. Somos eternos assim como todos os outros. Somos jovens assim como todos os velhos já foram e disseram um dia. Somos capazes assim como fomos incapazes e somos medrosos nos fim assim como fomos corajosos no começo.
Somos excessão apenas por sermos únicos no nosso mundo, no mundo que criamos para nossos excessos.
E se me excedo no apertar ou no soltar, é apenas por me exceder no querer ou no desistir. E querer de mais ou desistir de vez, isso sim é pecar. Porque ou pulamos longe de mais do abismo, ou nos seguramos na pedra mais segura:
talvez o chão esteja longe.