Algo eu digo:

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Iris

"Chove lá fora
E eu aqui
Juntando os pedaços

Não vou embora
Nem vou ficar
Para te ver em outros braços"

Talvez ainda seja cedo de mais
Ou quem sabe nunca seja tarde de mais

Para sangrar, tudo o que há
Na menina dos meus olhos
Nos olhos que eu vi, um dia
Chorar de amor
Que eu vi procurar, um dia
O que ficou

Mas eu te digo, menina
Não te torne um rio
Ser rio é sempre ruim
Se rio é para te ver assim
Voando

Tocando minh'alma
Exugando meu pranto
E não o teu
Me concedendo asas
Iguais as tuas
Anjo meu
E sempre me tornando
Um dia de cada vez
Um pouco mais humano
Um pouco mais eu

Aos olhos

Não fique assim
Já chove de mais lá fora
Onde vai guardar todas as memórias?
Onde vai levar tudo que foi embora?

Do pote dos seus sonhos
Só restaram os pedaços
Que te cortam as feridas
Mas que precisam ser juntados

Vê em ti, menina dos meus olhos
O anjo de que me chamas
A chama que me acalma
A calma que sustenta
O sustento de minh'alma
A alma que me toca
O toque de um anjo
Que me dá asas e me torna
Sempre mais humano

Eu sou assim
Um poquinho do que há em ti
Me faz feliz por inteiro então
Junte os cacos, corte os dedos
Mas remende o seu coração

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Torre de Bebel

Nenhuma montanha gosta de ser alta.
É ruim ser intocável, ter o cume longe de qualquer cafuné
E lá em cima é frio.
Nenhuma montanha gosta do frio.

Quando um grito a desperta
Quando um toque a aquece
Ela derruba a neve
A deixa correr solta, caótica, por seu corpo
A deixa deslizar, purificando, levando tudo em seu caminho
Tentando levar a montanha junto com ela
Tentando diminuí-la
Descê-la
Tranformá-la em homem
Fazê-la sentir
Tirar-lhe a dormência que o frio causa

Sei disso porque sou montanha
Ainda que em uma cordilheira
Sou apenas montanha

Cordilheira não é coletivo
É um conjunto de solidões
Onde os gritos ecoam
E o eco é um grito não ouvido
É um grito retornado
Uma avalanche que não se forma

Alpinistas se aventuraram em meus desafios
Deixaram pegadas em meus enigmas
Que cada avalanche absorveu
Tornando-me menor
Menos montanha

Mas os ventos sopram
Anunciam o inverno
Os alpinistas descem
A avalanche ecoa
E me torna montanha de novo

Mas nenhuma estação é eterna
Nenhuma montanha nasceu grande
Nenhum homem morreu pequeno
E toda neve já foi água

Os pássaros têm sede
Às vezes têm sede de água intocável
Às vezes só querem voar
E foi assim que aconteceu

Um pássaro pousou sobre mim, montanha
Triscou seus pés em minha dormência
Cantou seu canto rouco, que não ecoou
Bateu asas e voou
Fugiu, se libertou
Matou sua sede
Talvez até mais
Voou para baixo, para chegar lá em cima
E provocou um desmanche

- Avalanche!

Minha neve derreteu
Tornou-se água
Tornou-me transparente
Diminuiu-me
Desceu-me
Concedeu-me um sentido a mais
Levou embora tudo que tinha de alto
E do meio da cordilheira, da epiderme do meu tato
As certezas de que sou montanha somem
Isso porque sou menos montanha

E mais homem.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Minha geografia

Uma península é uma ilha
Até o dia em que olha pra trás
E descobre um continente